Eu tinha 12 anos quando tudo aconteceu. Meu coração palpitava, minhas mãos suavam, as pernas tremiam… Sentia o sangue subir pelas faces e tentava disfarçar o nervosismo arrumando o cabelo, olhando pro chão, falando sobre a beleza daquele lindo parque com seus bichos, seu verde, seu lago… Meu sorvete de morango tinha finalmente acabado e eu sabia que o beijo na boca seria inevitável dentro de poucos instantes.
Olhávamos para os lados a todo o momento, tensos… O medo de algum conhecido passar por ali era tremendo… Mas, eis que no meio do caminho… Tinha uma réplica de um trem Maria Fumaça… E, ao ver aquela cabine de maquinista tão oportuna, nos entreolhamos confiantes e sorridentes como se tivéssemos descoberto uma passagem secreta, um portal para outra dimensão. Era perfeito. Passamos por debaixo das correntes. Entramos e, como dois condutores afoitos por avançar rumo à próxima estação, enlaçamos as mãos e respiramos fundo… Porém, a vida também é feita de paradoxos e, de repente, aconteceu de o tempo parar…
Não estávamos mais em janeiro de 1985, nem tampouco no início do século 20 – que certamente vislumbrava o auge das marias fumaças reais… Estávamos suspensos no espaço. Não havia mais horas, minutos, segundos… Não havia mais ninguém à nossa volta… Então, do alto dos seus 14 anos, e certamente sentindo o peso de ser um legítimo representante do sexo masculino – que, geralmente, toma a iniciativa –, ele segurou meu rosto, mergulhou fundo no meu olhar e me puxou na direção dos seus lábios.
E foi aí que a cena romântica de cinema terminou para dar lugar ao pastelão… Sim, porque, naquela época, eu acreditava piamente que beijo na boca tinha gosto de tutti-frutti, morango ou uva – sabores idênticos aos dos chicletes que eu mais apreciava. Para piorar, nunca tinha me passado pela cabeça que beijar exigisse alguma técnica… O que fazer com a língua? Quando virar o rosto pra lá e pra cá, suavemente, como eu via nas novelas? Como respirar sem atrapalhar aqueles numerosos movimentos? Que ritmo tudo deveria ter? Quando parar? Quando abrir os olhos? Foi um atropelo e uma decepção… O pobre menino veio com tanta sede ao pote que eu me perdi completamente em meio à confusão de braços, lábios, pernas, cabelos… E, afinal, onde tinha ido parar o gosto de morango, tutti-fruti e uva que eu esperava? Tudo que eu sentia era o sabor sem graça da saliva alheia… Fiquei péssima. Pedi pra ir embora e o trauma foi tão grande que, daquele dia em diante, fugi do menino-namorado como o coisa ruim foge da cruz. Ele nunca entendeu e, segundo seus quatro ou cinco irmãos mais velhos faziam questão de me dizer repetidas vezes, sofreu horrores…
Hoje, quando lembro, morro de remorsos… Deveria ter dado mais uma chance a ele, a nós. Podíamos ter nos divertido, como dois adolescentes que éramos… Só fui entender a mecânica e os sentimentos avassaladores do beijo quase dois anos depois, quando me peguei refém de uma daquelas paixões de arrasar quarteirão… Daí pra frente, os beijos adquiriram o sabor que, de fato, devem ter: o gosto de eternidade.
Neste 13 de abril, em que se comemora o Dia do Beijo, este texto é uma homenagem a todos os beijos que roubei, ganhei, troquei, vivenciei… Mesmo àquele primeiro, repleto de “desejo”, “necessidade”, “vontade” e muita… Muita inexperiência.
E como eu ando numa fase “imagem”, segue um vídeo que é uma ode a todos os beijos capazes de, literalmente, fazer o tempo parar…