Mês passado o blog fez quatro anos. Já disse tudo e mais um pouco sobre mim neste espaço, mas resolvi comemorar (atrasada, como sempre) fazendo uma brincadeira: e seu tentasse me resumir em um único post? Vi que era impossível, mas achei o exercício válido e decidi compartilhar com quem vem sempre por aqui.
Vamos lá: meu apelido de infância é Gói e toda a minha família ainda me chama assim. Minha fruta preferida é jaboticaba, delícia que quando pronunciada carrega um som que considero doce como seu sumo. E sempre que me perfumo, é também com a essência das palavras.
Sou misto de terra, ar e mar. Terra porque apesar de estar longe, me sinto como que entranhada ao solo do sertão onde nasci. Ar porque sou espécie de ave extremamente avoada, com vertigem de altura, mas que ousa se deixar levar nos voos da imaginação. E mar simplesmente porque eu o trago em meu nome: GoiMAR. E não bastasse isso, nasci sob o signo de aquário, com ascendente em peixes. Mas a vida é uma piada pronta e a verdade é que não sei nadar. Então, um dia, ao olhar encantada o oceano à minha frente, escrevi: “Seria sereia / não fosse o medo / de maré cheia”.
Minha cor predileta? Lilás. Livro favorito? Dom Casmurro. Leio por paixão e escrevo por necessidade. Gosto de imprimir memórias e histórias. Tenho a impressão de que quem não escreve se perde, se esvai, some na poeira dessa grande esteira da vida. Morre, enfim, de verdade. Pra mim a escrita é lastro. Mastro onde me agarro.
Quando à noite me deito, sempre agradeço pela coberta, travesseiro, teto, universo. Choro quase todos os dias, basta assistir um noticiário, novela, filme. E a cada nova tragédia concluo, envergonhada, que minha fé é sazonal – uma vez que sofre baixa considerável na época das grandes chuvas, quando centenas de crianças e adultos morrem nas inundações do Sul e Sudeste deste país; ou ainda quando um avião cai, um prédio desaba, um terremoto atinge um país, a seca volta a castigar o sertão e por aí vai. Nessas horas recordo versos desesperados do poema Vozes d’ África, de Castro Alves, decorados quando eu tinha 13 anos: “Deus! ó Deus! Onde estás que não respondes? Em que mundo, em qu’ estrelas tu t’ escondes embuçado nos céus?”
Reclamo exageradamente e as três coisas que mais me tiram do sério são: acordar cedo, comida fria e toalha molhada. Tenho orgulho de ser nordestina, sertaneja, lírica, lunática, solar. E isso nunca atrapalhou meu caso de amor eterno com a cidade de São Paulo que, diga-se, não é ciumenta. Ao contrário: é polígama, volúvel, libertária.
Gosto de contar histórias, fazer versos, textos e contextos. No dia-a-dia me divido, multiplico, adiciono e subtraio e, como a maioria das mulheres: não tenho tempo. Ele é que me tem e me domina numa relação doentia e passional. Mas é preciso dizer que ele, às vezes, me concede a graça de fazer yoga e ir à manicure. Há mulheres que nem isso.
Meus maiores amores são meus filhos, ambos minha razão e minha loucura. Sou um misto de mãe judia e italiana. Vivo dando sermão, arrancando os cabelos, fazendo drama, monitorando suas vidas, fazendo projeções desnecessárias, sofrendo por antecipação. Mas tento melhorar a cada dia, menos no que se refere aos sermões. Acredito que não dar sermão é um descaminho. Uma ausência de palavra, discurso, retórica. E eu me recuso a criar meus filhos sem palavra, discurso, retórica, argumentação.
Fico arrepiada com gente que diz: “Não me arrependo de nada”. Já eu me arrependo de muitas coisas. E a primeira delas é ter gargalhado numa situação muito inadequada e, com isso, ter magoado profundamente minha melhor amiga. Eu tinha nove anos de idade e até hoje tenho vontade de chorar mordendo o travesseiro quando lembro a cena: os olhos dela me fitando incrédulos, cheios de lágrimas causadas por minha colossal insensibilidade… Deus, como lamento!
Amo viajar, mas detesto fazer malas. Então, fazer o quê? Não ir? Ficar? Não ver? Não conhecer? Nem pensar: deixe-me ir, preciso andar!
Tenho medo de avião, sapo, cobra, barata, rato, aranha, morcego, mariposa. Mas sofro mesmo é com o frio. Não tenho nenhuma vontade de neve, fondue, esqui ou lareira. Aliás, lareira pode ser: mas só pra fazer charme quando a temperatura dos corpos estiver bem quente.
Adoro bebida doce, tipo vinho do Porto e batida de morango (dessas com mais leite condensado do que álcool), mas quase nunca me atrevo porque meu fígado se assemelha a um projeto mal feito, inacabado. Bastam dois goles e é batata: a tremedeira nas pernas é certa e a língua solta também. E uma vez solta, ela dispara declamando poemas de Augusto dos Anjos, Drummond e Bandeira. E vamos combinar que declamar Bandeira com voz pastosa é uma tremenda bandeira. Ninguém merece (ouvir).
Gosto de música brasileira, ODEIO feijoada, cerveja, chope e tenho ojeriza a cigarro. Prefiro um trem da CPTM lotado, na hora do pico. E se o trabalho me obriga a entrevistar alguém que fuma, eu vou. Mas me sinto arrasada, humilhada, mortificada, impregnada pela fumaça e pelo odor que abomino e, como diz o samba: “volto pra casa abatida / desencantada da vida”.
Nunca acampei. Acho o fim da picada dormir no chão por opção, ainda mais com bicho por perto. Não tenho um pingo de vontade de escalar, pular de paraquedas, bungee jump, andar de montanha russa. Isso eu deixo pra quem tem coragem. É… Minha covardia é crônica. Não fosse isso, viveria mais (intensamente) do que escreveria, como faz a maioria das pessoas.
Gosto de falar horas ao telefone, com minha irmã e com quer mais puder e quiser. Gosto de dividir a vida com meu bem, meu “Mau”(rício). Adoro lugares espaçosos e acho uma delícia usar pantufas e pijamas com estampas infantis. Gosto de livros, livraria, biblioteca, revistas, museus, arte, fotografia, vista pro mar, roda de amigos, férias, viagens de trem, documentários, seriados, making of, processos de produção, cartas, raridades, barulho de ondas quebrando na praia, pôr-do-sol, comida japonesa, cachorro quente, spaghetti, ovos mexidos, dicionários e programas literários. E se um dia aparecesse o gênio da lâmpada e me concedesse apenas um desejo, esse estaria na ponta da língua: queria meu pai de volta. Pra sempre.
Pra começo, é isso. E como já disse no poema O Amor de Janaína: “No mar e no mais: tudo é sal, saudade. Que existe, apenas, para gerar em seu ventre poemas”. E pra você que me acompanha nesta estrada virtual: muito, muito obrigada! Brindemos (no meu caso com suco) ainda por muitos e muitos anos!