Quando tinha sete anos, minha mãe me levou pra fazer um teste no Conservatório Municipal de Cubatão, de modo que eu concorresse a uma vaga, disputadíssima, nas aulas de balé oferecidas pela instituição. A professora tinha uma cara péssima e, desde o primeiro momento em que entrei na sala, lançou sobre mim um olhar “carrasco” – embora eu ainda não conhecesse essa palavra. Mas o fato é que pude senti-la na espinha, solidificada por aqueles olhos frios, analíticos e descrentes da “educadora”.
A mulher me mandou cruzar a sala na ponta dos pés. Depois, eu deveria saltar e chegar ao chão com as pernas juntinhas, só que os pés, esses deveriam estar cada um apontando para um lado(!!!!). Também pediu pra eu saltar com os braços levantados, em arco. Eu não tinha nem a classe nem a elegância necessárias para isso. À época, aliás, minha especialidade era subir com incrível desenvoltura lá no pé de Seringueira do meu quintal. Se houvesse teste para isso, certamente eu ganharia em primeiro lugar, enchendo de orgulho a molecada da minha rua. Mas eu estava era em um teste para meninas finas e delicadas. Nesse contexto, minha performance se resumiu a um festival de horror. Fui sumariamente reprovada, claro, para desgosto de minha mãe.
Mas, a despeito daquela professora me fazer sentir um patinho feio e desengonçado em idade tão tenra, consegui sobreviver. E o que é mais incrível: sem odiar balé – o que, acho, seria perfeitamente compreensível. Ao contrário, admiro profundamente bailarinas e bailarinos, sejam reais, sejam representados sob forma de arte.
Dentre os que estão na categoria “reais”, minha preferência recai sobre o homem-pássaro Mikhail Baryshnikov – alguém a respeito do qual ainda escreverei por aqui. Já dentre os que existem apenas na seara das criações artísticas, minha eleita é a eterna bailarina de Degas (Little dancer aged fourteen, 1922), linda, imponente e majestosa, com sua saia rodada.
Vi a exposição de Degas em São Paulo, há uns dois ou três anos, mas rever essa bailarina lá na National Gallery of Art, em Washington DC, foi também um deleite que, paradoxalmente, me lembrou aquele malfadado teste feito na infância. Só me restou sorrir, sozinha, lá na galeria. Nada como o tempo para transformar sofrimento em texto e, até mesmo, em sorriso…
Devo ao cinema minha admiração pelas obras de Auguste Rodin. Não fosse ter visto o maravilhoso filme Camille Claudel (1988), ainda na adolescência, provalmente eu demoraria ainda mais para saber sobre a existência do mestre francês. Não pude ver suas peças quando expostas aqui em São Paulo, na década de 90. Por isso, mal pude conter a alegria quando, ao caminhar entre as esculturas da National Gallery of Art lá de Washington DC, deparei com uma de suas obras mais famosas: O beijo (Le baiser). Não é linda?
Woman with a parasol – Madame Monet and her son, 1875, National Gallery of Art, Washington DC. Por coincidência, minha filha Tatá tinha passado o bimestre estudando Monet nas aulas de arte, na escola. Ela adora esse quadro e quando o vi lá no Museu, lembrei demais da minha pequena-grande-menina…
Cape cod evening, Edward Hopper, 1939 – National Gallery of Art, Washington DC.
Mais um quadro do Hopper me fazendo perder o fôlego, adoro…